“Eu senti que, se estivéssemos tentando retratar a bulimia de uma forma honesta, teríamos que realmente mostrá-la. Caso contrário, seria um desserviço para qualquer pessoa que já passou por isso”, disse a atriz Emma Corrin, que interpreta a Lady Di na 4ª temporada de The Crown, da Netflix, sobre a abordagem que a série daria para o transtorno alimentar enfrentado pela Princesa Diana.
Diana foi uma das primeiras pessoas a se posicionar publicamente sobre a bulimia, quando o tema ainda era um tabu. “Eu chegava em casa e era muito difícil saber como confortar a mim mesma depois de passar o dia confortando outras pessoas. Então, eu pulava para a geladeira”, contou a Princesa de Gales em uma entrevista à BBC, em 1995. A mãe de Willian e Harry sofria de bulimia nervosa, que foi possivelmente agravada pelo relacionamento conturbado que tinha com o marido, o Príncipe Charles, do qual iniciou o processo de divórcio em 1992, tendo ele sido oficializado apenas em 1996.
Assim como a princesa, dois milhões de pessoas são diagnosticadas com bulimia por ano no mundo. No Brasil, segundo a OMS, 10% dos jovens sofrem com algum tipo de distúrbio alimentar, sendo a bulimia nervosa um dos mais frequentes. Pensado nisso, a CAPRICHO preparou este guia completo sobre o transtorno, que inclui desde os seus principais sintomas até as formas de tratamento, para disseminar informação e ajudar a reduzir esse número.
1. O que é a bulimia?
A bulimia nervosa é uma doença psiquiátrica, que está dentro dos transtornos alimentares, caracterizada por episódios frequentes de compulsão e purgação, de acordo com Ana Carolina Pereira Costa, nutricionista do Programa de Transtornos Alimentares do IPqHCFMUSP. “Existe a sensação de perda de controle, ou seja, o indivíduo sente que não consegue parar de comer”, explica a nutricionista. Na bulimia, isso é seguido de um comportamento purgativo, que o indivíduo usa para compensar aquela sensação compulsiva, como a provocação do vômito, o uso de remédios, drogas, a prática do jejum e/ou o excesso de exercícios físicos.
Segundo dados internacionais, para cada três mulheres com bulimia, existe um homem diagnosticado com o transtorno. Apesar de existirem mais casos entre mulheres, a nutricionista lembra que homens também merecem atenção, pois, por medo de serem julgados e vistos como menos masculinos, vários deles se esforçam para esconder a doença e levam mais tempo para pedir ajudar. Contudo, é inegável que os padrões de beleza e as pressões estéticas contribuem para o diagnóstico ser mais comum em pessoas do sexo feminino.
2. Quais são os sintomas?
Os sintomas da bulimia nervosa são sinais comportamentais, psicológicos e físicos que tendem a aparecer combinados. Um dos principais deles são os métodos compensatórios, sendo o mais corriqueiro o vômito. A pessoa bulímica tem o hábito de ir ao banheiro sempre depois das refeição. Além disso, também pode apresentar obsessão por atividades físicas, por queima de calorias e dietas restritivas. Entre os sinais físicos, estão mudanças constantes de peso, sensação de inchaço, de fadiga, desmaios e tonturas.
Algumas consequências da bulimia também podem ser vistas como sinais, apesar de aparecerem quando a doença já s encontra em estágio avançado. Elas incluem erosão dentária e complicações bucais, desidratação, gastrite e esofagite, danos ao intestino grosso e até parada cardiorrespiratória, causada pela perda de potássio.
3. Quais são as causas?
Segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de 10% dos jovens brasileiros sofrem com distúrbios alimentares. Em São Paulo, uma pesquisa realizada pela Secretaria do Estado da Saúde mostrou que 77% das jovens estão propensas a ter algum tipo de transtorno alimentar.
A bulimia é um transtorno multifatorial, que pode ser social, cultural, ambiental ou de predisposição genética. No campo social, o uso das redes sociais, que já é associado à depressão e ansiedade, também está ligado ao agravamento de transtornos alimentares. Apesar de nos últimos anos o cenário ter mudado, muito por causa de movimentos importantes como o do #CorpoLivre, as redes, especialmente o Instagram, ainda são um ambiente em que a busca por um padrão de corpo irreal é constantemente reforçada e o culto a magreza é incentivado. Segundo pesquisa TIC Kids Online, de 2018, realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil, uma em cada quatro meninas de 11 a 17 anos afirmou já ter entrado em contato com conteúdos na internet sobre como ficar muito magra.
Apesar de estudos sobre o tema ainda estarem em andamento, pesquisadores e psicólogos acreditam que os transtornos alimentares tenham se agravado durante a quarentena. “A pandemia de coronavírus causou disfunções em nosso organismo com a mudança da rotina, o tempo vago, o excesso de informações negativas em relação a doença”, alerta o psicólogo Fabiano de Abreu.
4. A bulimia é também um transtorno mental?
Além de um transtorno alimentar, como citamos no começo deste guia, a bulimia também é um transtorno psicológico. “Trata-se de um transtorno por ser algo compulsivo, que a pessoa pode não ter controle e que envolve também a perda da razão. Ou seja, a pessoa não consegue dominar sua própria emoção na compulsão“, esclarece Fabiano.
Segundo o Manual de Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais, uma das características da bulimia é essa compulsão ocorrer com a frequência de dois episódios por semana, durante três meses consecutivos.
5. Como tratar?
A bulimia tem cura? A nutricionista Ana Carolina diz que sim, é possível vencer a bulimia e que um dos caminhos mais recomendados é através de um tratamento multiprofissional. “É um tratamento bastante prolongado, de no mínimo seis meses a um ano, para ajudar o indivíduo a melhorar sua relação com a alimentação e o corpo. Tudo isso é um trabalho que o nutricionista pode fazer junto com um psicólogo e um psiquiatra”, pontua a especialista, que enfatiza a importância desses profissionais terem o treinamento adequado. Abreu reforça que “é importante ter o acompanhamento de um médico para, se for necessário, receitar o uso de remédios antidepressivos e até que ajudam a evitar o vômito”. O psicólogo lembra que, em casos extremos, o paciente corre graves riscos, inclusive o de vida, e que a internação em clínicas especializadas em transtornos alimentares pode ser necessária.
Por muito tempo, a Princesa Diana enfrentou a bulimia nervosa em silêncio, como milhões de meninas e mulheres mundo afora. Pressões estéticas e sociais estão entre os principais estopins, além da romantização dos transtornos alimentares, que ainda ocorre em nossa sociedade. Se você acredita estar enfrentando um transtorno alimentar, converse com pessoas de confiança, não tenha medo ou vergonha de pedir ajuda e busque apoio profissional. Figuras reconhecidas, como a própria Diana de Gales, usaram a fama para falar abertamente sobre o assunto e mostrar que nenhuma de nós está sozinha, e que todas podemos vencer essa luta!