A Lei do Feminicídio foi aprovada no Brasil há três anos, mas pouco se fala sobre ela. Mesmo que a morte de mulheres motivadas por questão de gênero seja agora (e finalmente) classificada como crime hediondo, muitos relacionamentos abusivos e casos de violência doméstica ainda são descobertos quando já é tarde demais. E as taxas só aumentam. De acordo com um levantamento feito pelo G1, 12 mulheres são vítimas de feminicídio diariamente no país.
Ao que indica as investigações policiais, a advogada Tatiane Spitzner, de 29 anos, entrou para essa estatística no último dia 22 de julho. Após discutir e sofrer diversas agressões do marido Luís Felipe Mainvailer, de 32 anos, ela foi jogada da sacada do apartamento em que o casal morava, no 4º andar de um prédio em Guarapuava, no Paraná.
O RELACIONAMENTO
Tatiane e Luís Felipe se casaram em 2013 e moraram na Alemanha durante três anos, para estudar. De acordo com amigas da advogada, qualquer coisa se tornava motivo para uma discussão. Apesar de nunca falar sobre as agressões físicas, Tatiane também costumava aparecer com hematomas roxos nos braços – mas sempre desconversava.
Em março deste ano, a advogada mandou mensagens para uma amiga dizendo que Luís Felipe era “grosseiro e estúpido” e que “tinha ódio mortal” dela. Na conversa, ela também revelou que o marido mudou completamente após começar a tomar anabolizantes hormonais. Tatiane dizia para a amiga que só faltava coragem para encarar o divórcio. Quando ela ameaçava se separar, Luís Felipe começava a chorar e dizer que a amava. E que ia mudar, é claro. Típico.
O CRIME
Na madrugada de domingo, 22 de julho, Tatiane e Luís Felipe começaram uma discussão em um bar. Por volta das 2h, o casal voltou para casa. No carro, ainda na rua, imagens de câmeras de segurança registraram o momento em que Luís Felipe bateu em Tatiane, dado-lhe socos e tapas no rosto.
No estacionamento do prédio, as agressões continuaram. De acordo com a polícia e as análises dos vídeos de segurança, Luís Felipe, que é faixa roxa de jiu jitsu, chegou a dar o golpe “mata leão” em Tatiane, que ficou cerca de dois minutos imóvel no chão do estacionamento. Ele deu um chute nela e a levantou do chão. Tatiane, ao recobrar os sentidos, tentou fugir.
Dentro do elevador, Tatiane apertou desesperadamente um botão, para tentar se livrar da perseguição, mas Luís Felipe a alcançou, a segurou com força e impediu sua fuga. O momento de saída do elevador é o último instante em que a advogada aparece com vida nas câmeras de segurança do prédio. 15 minutos se passaram desde o último registro dela no elevador até o momento da queda. Para a polícia, vizinhos afirmaram que escutaram o casal discutindo e Tatiane pedindo “socorro” diversas vezes.
Às 2h57, Tatiane “caiu” da sacada. Luís Felipe desceu até a calçada e levou o corpo da advogada de volta para o apartamento. Em seguida, ele apareceu com uma camisa diferente, limpando o sangue do elevador. Às 3h08, policiais apareceram na entrada do prédio, mas Luís Felipe já havia fugido com o carro. De acordo com a polícia, ele estaria indo em direção ao Paraguai. Os indícios são de que Luís forçou uma fuga, armou um acidente fake e colocou a culpa no emocional, pois tinha acabado de ver a esposa se suicidar.
A INVESTIGAÇÃO
Luís Felipe foi detido após sofrer um acidente de trânsito durante a possível fuga. Em depoimento à polícia, ele negou ter agredido a esposa e ainda afirmou que a amava. Segundo Luís Felipe, ela teria se jogado da sacada.
De acordo com a perícia realizada pelo Instituto de Criminalística, Tatiane teve uma fratura no pescoço, característica de quem foi estrangulada. Na tarde da última segunda-feira, 6, o Ministério Público do Paraná (MP-PR) denunciou Luís Felipe Mainvailer pelo crime de homicídio com quatro qualificadoras: meio cruel, dificultar defesa da vítima, motivo torpe e feminicídio. Além disso, ele também foi acusado de fraude processual por alterar a cena do crime e manter vítima em cárcere privado.
Biólogo e professor, Luís Felipe fez graduação e mestrado em uma universidade federal e um doutorado em uma universidade alemã. Ele desenvolvia pesquisas de relevância pública e era muito respeitado em sua área, mas nada disso o impediu de agredir cruelmente sua esposa. Não que seja necessário reforçar, mas isso prova que nenhum diploma ou conhecimento é capaz de garantir o caráter de alguém, principalmente porque este tipo de atitude pode vir de qualquer pessoa, até mesmo de quem se menos espera.
O Brasil é o quinto país que mais mata mulheres no mundo. Essa é a história da Tatiana, da Clara, da Maria… É muito difícil que a vítima consiga sair sozinha de um relacionamento abusivo e a tendência é que o clico de agressões, física e moral, se repita. Não há mudança, mas, muitas vezes, a mulher acredita nisso pois tem medo de denunciar ou se sente culpada. Nunca é sua culpa. Não foi culpa da Tatiana. Nem da Clara. Nem da Maria.
Fique atenta ao site da CAPRICHO para acompanhar as atualizações sobre o caso e as investigações.