Em 2016, o “Projeto Sexualidade da USP” conversou com 3 mil pessoas. 20% das mulheres entrevistadas falaram que nunca haviam se masturbado, enquanto apenas 2,2% dos homens admitiram nunca terem praticado o ato. Se a masturbação ainda é um tabu grande entre adultas, entre adolescentes ela é praticamente um assunto proibido nas rodinhas de conversa. Em contrapartida, durante a puberdade, os meninos parecem sentir uma fixação louca em falar sobre seus órgão genitais e o que fazem com eles. Alguns menos, outros mais, mas definitivamente sem maiores tabu. Coisa de menino?! Não, a masturbação é coisa de todo mundo.
Ter vergonha de conversar sobre o assunto vem da falta de hábito de as mulheres falarem sobre a prática, consequência de uma herança patriarcal de anos e anos. Na Idade Média, por exemplo, quem dominava e ditava as regras era a Igreja Católica. Apesar de pregar que homens e mulheres estavam expostos ao mal, por serem livres, e de algumas figuras femininas terem destaque na sociedade, os altos cargos ainda eram dominados por homens brancos e ricos. O papel da maioria das mulheres era o de cuidar da casa e serem provedoras, e qualquer ato relacionado ao prazer pessoal era visto como pecaminoso, digno de mulheres que não eram vistas como para casar.
A discussão é longa e, apesar de hoje algumas pessoas ainda verem a masturbação feminina como pecado, sendo que a masculina é vista como uma espécie de necessidade hormonal, há um entendimento maior sobre o assunto, muito por causa do acesso a informações com baseamento científico. Tanto quanto homens, mulheres têm a necessidade e o direito de se satisfazerem sexualmente sozinhas ou acompanhadas, se forem de seu consentimento. Durante a situação de isolamento social, a prática vem ganhando mais espaço e sendo mais discutida.
Alguns cuidados básicos devem ser tomados para que a masturbação feminina seja feita com segurança. Conversamos com a Dra. Monique Novacek, ginecologia, obstetra e mastologista da Clínica Mantelli, para criar este “Guia Definitivo da Masturbação Feminina Segura para Mulheres”. Porque, cientificamente falando, não há nada de errado em se masturbar. Muito pelo contrário.
1. Existe alguma contraindicação na prática?
Não, o importante é se divertir e ter prazer.
2. A masturbação traz benefícios para a mulher?
São muitos os benefícios, como pontua a ginecologista Monique Novacek. Além de liberar o estresse e a ansiedade, a prática aumenta a circulação sanguínea na região íntima, promovendo uma vagina mais saudável. A masturbação aumenta a libido, previne a incontinência urinária, por aumentar o tônus dos músculos da pelve, e pode ajudar no tratamento de doenças sexuais, como vaginismo e dispareunia (dor durante a relação sexual). “A mulher que se masturba acaba conhecendo muito mais seu corpo, tendo muito mais liberdade na hora de uma relação a dois, sabendo mostrar para o parceiro o que mais te dá prazer. Isso gera uma autoconfiança enorme, assim como a sensação de bem-estar que o orgasmo promove, que também é grande. Isso porque, durante a masturbação, hormônios responsáveis pela alegria e pelo amor, como a ocitocina, são liberados”, explica a especialista.
3. Quais são os objetos mais comuns e os mais perigosos que as mulheres costumam usar para praticar a masturbação? Quais são os riscos que eles trazem?
A ginecologista diz que os objetos inadvertidos mais comuns que costumam ser introduzidos na vagina pelas mulheres são escova de dentes, pepino, cenoura, batata doce e banana. Eles apresentam risco porque podem acabar quebrando durante a prática, ficando presos dentro do corpo e precisando de ajuda médica para serem retirados com segurança. Diferentemente dos vibradores, a finalidade desses itens não é o prazer sexual, podendo ainda causar alegrias e ferimentos. “O chuveirinho do banheiro também é muito utilizado e ele não apresenta grandes riscos, desde que seja utilizado só o jato de água direcionado ao clitóris. Jamais introduza o chuveirinho na vagina”, alerta Monique, que aproveita para fazer outro apelo: “nunca utilize objetos pontiagudos para praticar a masturbação, pois há riscos de cortes graves na região vaginal e anal”.
Recentemente, viralizou online a história de uma garota que estava estimulando o clitóris com um desodorante aerosol, que acabou sendo ativado sem querer, espirrando produto dentro da vagina da menina. Ela, segundo relato, sentiu uma ardência muito forte e teve sangramento. Durante a masturbação, vale o bom senso. Não coloque sua saúde em risco em prol de um prazer que pode ser encontrado utilizando objetos seguros para a prática.
4. É possível a garota se machucar usando as próprias mãos?
É possível, apesar de raro. Se a unha estiver muito comprida, há risco de arranhões, principalmente se a mulher tentar introduzir dedos na vagina. A realização de movimentos repetitivos e agressivos também pode causar fissuras. É sempre interessante o uso de lubrificantes quando sentir que a “brincadeira” pode se tornar mais intensa.
5. Sex shops não são recomendados para menores de 18. Como adolescentes podem se masturbar com segurança em suas casas? Só com as mãos ou algo a mais?
A especialista garante que não há melhor maneira de ter total controle sobre o corpo que se masturbando usando as mãos. “Comece com os dedos, assim você consegue conhecer melhor seu corpo e a sensação que cada lugar tocado te dá. As principais regiões a serem exploradas são a vagina e o clitóris, mas existem muitas formas de se masturbar”, salienta a Dra. Monique. Por exemplo, dá pra friccionar o clitóris esfregando repetidamente a vulva no colchão da cama, fazer movimentos repetitivos em uma cadeira, friccionar o clitóris com um travesseiros ou almofada, e ainda utilizar uma toalha enrolada no meio das pernas para fazer movimentos de vai e vem. A única coisa é que todos esses objetos usados precisam estar com a higiene em dia. O chuveirinho também pode se tornar seu melhor amigo durante o banho, basta lembrar de não introduzi-lo na vagina, apenas estimular o clitóris com o jato de água que sai dele. “Adolescentes também podem comprar vibradores e outros adereços online”, a médica dá a dica. Lembrando que compras virtuais precisam de um cartão de crédito e ser entregues em um endereço, e nem sempre a jovem se sente confortável em receber tais produtos em casa.
6. Precisa colocar camisinha no vibrador?
É altamente recomendado que sim. Além de aumentar a vida útil do produto, o preservativo protege sua vulva e vagina de entrarem em contato com possíveis substâncias tóxicas que estejam presentes nos vibradores ou nos lubrificantes neles colocados. Não são substâncias que causam um mal imediato, mas, a longo prazo, podem mostrar-se cancerígenas. Além disso, há mulheres que introduzem os vibradores também no ânus. É uma região cheia de micro-organismos que podem prejudicar a flora vaginal. Por isso, toda vez que o vibrador for introduzido no ânus, a camisinha precisa ser trocada antes que haja a introdução dele na vagina. Nada disso dispensa a higienização do “brinquedo”, ok? Ela deve ser feita com sabão neutro e água morna toda vez que ele for utilizado.
7. Com o distanciamento social, a prática da masturbação tem sido uma saída para aliviar o desejo sexual. Masturbar-se em excesso faz mal?
Não, muito pelo contrário. De acordo com a Dra. Monique Novacek é importante que a mulher se sinta livre para se masturbar quantas vezes quiser e/ou sentir necessidade. Contudo, se achar que o desejo está excessivo e a prática está atrapalhando o andamento da vida e a realização de tarefas importantes, é importante conversar com um especialista e buscar ajuda. “Podemos estar diante de uma doença psiquiátrica chamada ninfomania”, alerta a especialista.
8. A masturbação é só o toque na região genital feminina?
Não. O corpo feminino tem muitas áreas que geram prazer e a mulher pode percorrer todas elas, como nuca, seios, pernas e nádegas, antes de chegar à vulva, aos pequenos e grandes lábios, e ao clitóris. “Todo esse caminho já irá excitar a mulher e preparar o corpo para o orgasmo”, explica a ginecologista. Vale lembrar que não é porque sua amiga fica excitada ao tocar os seios que você também vai ficar. Cada corpo é um corpo, e o principal intuito da masturbação feminina, além de dar prazer, é fazer a mulher conhecer e entender seu corpo mais a fundo, explorando novas áreas e novos toques.
9. É possível perder a virgindade se masturbando?
Depende do que a mulher considera perder a virgindade. Para algumas, ela é uma questão apenas biológica, ou seja, basta o hímen ser rompido, mesmo que não por um pênis, que a virgindade é perdida. Para outras, um recorte psicológico também é levado em conta e a mulher só perde a virgindade quando há sexo a dois, ou seja, quando há a penetração de um pênis na vagina (isso para relações heterossexuais). Garotas que são virgens se sentem menos seguras e confortáveis em introduzir algo na vagina, explorando mais a vulva e o clitóris. Respeitar seus limites e vontades é importantíssimo, afinal, como salienta a Dra. Monique, “a masturbação não precisa necessariamente envolver a introdução de objetos na vagina”.
10. Existe uma melhor hora do dia para se masturbar?
“A hora que tiver vontade”, garante a médica ginecologista, que completa dizendo que o importante é se permitir: “para masturbação não existe regras. Pode ser ao acordar, no meio da manhã, à tarde ou antes de dormir”. Essas experimentações também podem ser exploradas pelas mulheres, que acabam descobrindo preferência de horários, não só de toques. É importante apenas que o ato não vire algo mecânico e compulsivo, e que você esteja sempre no clima. Não adianta comer um prato de macarronada e querer se masturbar logo depois do almoço – até porque a vontade de tirar uma soneca, provavelmente, será maior.
11. A sensação de prazer é sempre a mesma?
Não. Depende do dia, do toque, da vontade… Mas uma coisa é importante destacar: as mulheres conseguem ter dois tipos de orgasmos, que são o vaginal e o clitoriano. Ou seja, é possível alcançar o pico do prazer estimulando apenas o clitóris e é possível “chegar lá” ou potencializar essa sensação com estímulos na vagina. A pressa é inimiga da perfeição, né, Dra. Monique?