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Questionar o processo eleitoral é um perigo para a democracia de um país

Especialistas explicam à CAPRICHO que, a partir do momento em que urnas eletrônicas são questionadas, toda a estrutura democrática também é.

Por Marcela de Mingo, para a Capricho Atualizado em 6 mar 2024, 16h57 - Publicado em 24 Maio 2022, 22h12
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a primeira vez, ninguém deu muita bola. Na segunda, começou a ficar estranho. À terceira tentativa, o barulho que acompanhou foi maior. Agora, o que vemos é uma verdadeira cruzada. O alvo? As eleições de 2022

Não entendeu nada? Calma, a gente te explica. Todo mundo já sabe que esse ano é ano de eleições presidenciais – a gente até fez uma super campanha para incentivar a nossa galera a votar em outubro – e entre a corrida oral e a polarização de direita e esquerda, dúvidas estão sendo jogadas sobre a veracidade do sistema eleitoral brasileiro.

Talvez você não saiba disso, mas o nosso sistema é referência para o mundo todo. Quando o assunto são eleições, estamos muito avançados em relação a algumas das maiores potências mundiais, como os Estados Unidos, que ainda fazem eleições majoritariamente com cédulas de papel. 

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“Processos eleitorais são fundamentais para que democracias se mantenham”, explica Flávia Biroli, professora de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) em conversa com a CAPRICHO.

Esse sistema super bem montado e, principalmente, seguro, está sendo amplamente questionado pelo presidente atual, Jair Bolsonaro (PL). No último mês, o chefe do executivo escalonou os ataques ao sistema eletrônico de votação, questionando sua eficácia junto às Forças Armadas e, entre outras falas, ameaçou que seu partido irá contratar uma empresa para fazer uma auditoria privada das eleições deste ano.

Em contrapartida, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) informou que os testes do sistema, que inclui simulações de ataques hackers, não encontraram falhas que possam atrapalhar o pleito eleitoral. O ministro Edson Fachin, presidente do TSE, também afirmou que eleições no Brasil são conduzidas pelas forças “desarmadas”, em resposta indireta aos comentários.

Essa questão é tão séria que um grupo de juristas e professores brasileiros entregaram para à relator da ONU (Organização das Nações Unidas) um documento em que explicam os seus temores diante dos constantes ataques do presidente Bolsonaro e da sua base de apoiadores ao sistema eleitoral. 

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Processos eleitorais são fundamentais para que democracias se mantenham

Flávia Biroli

Neste mês, a coalizão Pacto pela Democracia, que reúne mais de 200 organizações da sociedade civil e atores políticos, lançou o manifesto “Em defesa das eleições”, para cobrar a mobilização de instituições em defesa do processo eleitoral diante dos ataques de Bolsonaro.

As organizações Artigo 19, Instituto Não Aceito Corrupção, Instituto de Defesa do Direito de Defesa, Transparência Internacional, Greenpeace Brasil, Conectas Direitos Humanos e WWF Brasil participaram da entrega do manifesto aos presidentes do STF e do TSE.

Dúvidas antigas, novos protagonistas

Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro protestam na Avenida Paulista, em São Paulo, e pedem
Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro protestam na Avenida Paulista, em São Paulo, e pedem “voto auditável”. Anadolu Agency / Colaborador/Getty Images

O voto é a arma mais poderosa que um cidadão tem em uma democracia. A partir do momento em que ele é questionado, questiona-se também toda a estrutura democrática, o que abre brechas para regimes autoritários – como a própria ditadura que o Brasil viveu de 1964 a 1985, por exemplo.

“Eles permitem [sistemas eleitorais] a participação na escolha dos representantes e, com isso, uma incidência no futuro do país”, explica Biroli. “É a forma predominante de participação nas democracias liberais, e neste ano, particularmente, estamos vindo de um processo intenso de crise, que pode ser pensado como um processo de desdemocratização – as eleições são fundamentais, e até mesmo os procedimentos básicos da democracia estão em risco”, conclui a especialista.

Ah, mas se engana quem pensa que essas dúvidas surgiram só agora, viu? Essa sementinha foi plantada nas eleições de 2014, quando o então candidato à presidência Aécio Neves duvidou publicamente dos resultados das urnas, após resultado confirmar a reeleição de Dilma Rousseff. Essas dúvidas a respeito de um processo totalmente seguro e anti-fraude foi usado como estratégia política – e o fim dessa história a gente conhece bem.

Bolsonaro tem mantido desde a campanha de 2018 um discurso em que, sem nenhuma prova, coloca dúvidas sobre o sistema eleitoral brasileiro. Em várias ocasiões ele deu a entender que não aceitará outro resultado que não seja a sua vitória em outubro deste ano, o que gera um desequilíbrio de forças políticas que nunca vimos por aqui desde a redemocratização.

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“Existe uma reação por parte de Bolsonaro e de seu entorno que procura deslegitimar as eleições com vistas a deslegitimar o seu resultado. É uma ação antidemocrática porque contesta o processo eleitoral e as urnas – eles o contestam porque criam um ambiente para poder contestar o resultado das urnas. Em outras palavras, um ambiente favorável a um golpe”, analisa Biroli.

A avaliação da especialista também espelha o resultado de um levantamento recente feito pelo jornal Folha de S. Paulo que mostra que os principais líderes políticos do país enxergam flerte com um comportamento golpista nas ações do mandatário.

Qual a melhor ferramenta no meio dessa crise?

Voto jovem
Diante de um cenário como o que nós estamos vivendo, a melhor coisa que podemos fazer é um uso consciente das redes sociais Getty Images/Getty Images

Definitivamente, a informação. Diante de um cenário como o que nós estamos vivendo, a melhor coisa que podemos fazer é um uso consciente das redes sociais – ou seja, acompanhando pessoas que entendam sobre o assunto, engajando com causas que são importantes para a gente e buscando informações corretas e precisas – nada de dar audiência para as fake news que a gente recebe pelo WhatsApp. 

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“O processo eleitoral brasileiro e o uso das urnas eletrônicas garante maior segurança e transparência na votação e apuração dos votos”, reforça a ativista Marcela Barros, de 19 anos, estudante de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB).

“O antigo processo eleitoral, em que os votos eram registrados em cédulas de papel e apurados manualmente, além de ser mais lento, permitia fraudes e erros na contagem. Nosso sistema eleitoral é eficiente e seguro e por isso é referência para o resto do mundo – as críticas a ele não têm fundamentos teóricos. Logo, o que precisamos agora é difundir essa informação e combater as fake news promovidas pelo atual presidente, as quais atentam contra a nossa democracia.”

Reforçar a democracia é não só confiar no sistema eleitoral como também nos órgãos e instituições que garantem o seu bom funcionamento – é o caso do TSE.

Manter o sistema democrático funcionando significa também respeitar os resultados eleitorais e, principalmente, o direito dos cidadãos de um país de atuarem na escolha dos seus governantes. Sem isso, não existe democracia e sem democracia, está ameaçada a possibilidade de construir o país que seja de todos.

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