“Quem mandou matar minha mãe?”. Faz cinco anos que Luyara Franco faz essa pergunta para si mesma, para a Justiça e para seus seguidores nas redes sociais. Cada postagem lembrando Marielle mantém viva a memória da ativista, morta no dia 14 de março de 2018, no Rio de Janeiro, em um feminicídio político que até hoje segue sem solução.
Em entrevista para a CAPRICHO, Luyara, que é também cofundadora do Instituto Marielle Franco, fala sobre o 14M, a morte da mãe e do motorista Anderson Gomes, sobre resistência, justiça e preservação da memória, e garante: “Cada dia sem respostas serve para alimentar o ciclo de violência política no Brasil”.
CH: O assassinato de Marielle e Anderson completa cinco anos sem a identificação dos mandantes – apesar de termos Ronnie Lessa e Élcio Queiroz na cadeia. A sensação é de impunidade?
Luyara Franco: São meia década de ausência de respostas sobre quem mandou matar Marielle e por quê. Essa ausência de respostas reflete a negligência e a impunidade estrutural em casos de crimes contra a vida de defensores de direitos humanos. A investigação do caso de Marielle e Anderson, portanto, diz muito sobre como o Estado brasileiro lida com graves violações de direitos humanos, especialmente aquelas cometidas contra mulheres negras que participam da política institucional. Esse crime marcou a história política brasileira e mundial, demonstrando a fragilidade da democracia no nosso país, e levantou a importância do debate da violência política de gênero e raça, da violência letal LGBTfóbica e do ataque a defensores de direitos humanos no Brasil.
Essa demora do sistema de justiça nos provoca de alguma forma revolta e frustração. Já faz cinco anos. É tempo demais! Cada dia sem respostas serve para alimentar o ciclo de violência política no Brasil. É muito importante frisar que nós não iremos desistir até alcançarmos justiça para Marielle e Anderson.
Ao longo desses anos, continuamos resistindo e cobrando das autoridades competentes. Nesses cinco anos, nós lutamos por justiça e também para manter viva a memória da Mari, porque sabemos que, quanto mais o tempo passa, mais difícil fica garantir o conhecimento da memória sobre quem foi Marielle, principalmente por parte das novas gerações. Defender sua memória para que as futuras gerações sigam lembrando quem Marielle foi e o que ela representa também fortalece a nossa luta por justiça.
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CH: O Instituto Marielle Franco trabalha para manter o legado da vereadora vivo. Mas como nós podemos nos tornar sementes da Marielle e fazer isso no dia a dia?
Luyara Franco: Nosso seguir em frente já é uma forma de ser semente. Eles acharam que matando minha mãe iriam acabar com suas ideias e planos. Qualquer ação em nome dela (homenagem, grafite, música, entrar para a política, etc) é ser semente.
No Instituto, temos a Rede de Sementes, que é uma rede de ativistas de todos os cantos do país. Essa rede se reune nacionalmente todo mês para pensar e executar estratégias e ações para inspirar, conectar e potencializar pessoas pretas, periféricas e LGBTQIA+ ,a seguirem ocupando diversos espaço e promovendo transformações, como minha mãe fez.
Este mês estamos com a campanha “Março por Marielle e Anderson”, que é um conjunto de atividades pedindo justiça. Muitas dessas ações estão sendo lideradas por nossas sementes da rede, nas suas favelas, bairros, em centros culturais, universidades.
CH: Como filha de Marielle Franco, mulher negra e periférica, qual é o seu desejo para o mundo?
Luyara Franco: Meu desejo é que mulheres negras ocupem os lugares de decisão e não precisem se preocupar se terão suas vidas ceifadas. Que meninas negras se inspirem em outras mulheres negras e acreditem que tudo é possível.
CH: O presidente Lula (PT) assinou o PL que prevê a criação do Dia Marielle Franco. Como foi para você receber essa notícia?
Luyara Franco: É com satisfação que recebi a notícia de que o presidente Lula apresentou ao Congresso o projeto de lei que institui o dia 14 de março como Dia Marielle Franco, com foco no enfrentamento à violência política. O Instituto Marielle Franco nasce de um feminicídio político e, desde sua fundação, sempre se dedicou ao enfrentamento à violência política de gênero e raça. Acreditamos que mulheres negras devem poder exercer seus mandatos políticos sem medo e é fundamental que as instituições ponham em prática estratégias e mecanismos robustos de acolhimento e enfrentamento a essas violência. Nossa luta é por justiça, reparação e não repetição, de forma que mulheres negras possam chegar e permanecer em espaços de poder como a política institucional. A criação do Dia Marielle Franco representará um passo importante não só em termos de preservação da memória, como também deve servir de oportunidade para outros avanços importantes para a garantia da vida e segurança de mulheres negras, cis e trans, que disputam a política todos os dias.
CH: Você começou um projeto de arte em resina, o Lubuntu. Qual é a importância da arte como forma de resistência?
Luyara Franco: Arte pra mim é forma de expressão, de respiro, de resistência, de calmaria. Arte pra mim é a forma mais pura de transmitir um sentimento. Arte pra mim é liberdade. Arte pra mim é renascer.
CH: Qual recado você acha que Marielle, mãe, vereadora e ativista feminista e do movimento negro, daria neste 14 de março?
Luyara Franco: Daria o recado de sempre, que é ser resistência, seguir em frente, fazer pelo outro e ser luta.