Após seis anos morando em São Paulo, eu, Sofia Duarte, repórter de moda e beleza da CAPRICHO, finalmente transferi meu título de eleitor para a capital; cumpri o procedimento de forma fácil e rápida e pronto: já estava habilitada para votar em uma escola estadual a uma quadra da minha casa.
Até que, em agosto, fui convocada para trabalhar como secretária na mesa receptora de votos da minha seção eleitoral. Recebi uma mensagem no WhatsApp do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo e, no começo, achei até que era trote, mas chequei o meu e-mail e lá estava a confirmação de que era real mesmo.
Meu primeiro pensamento foi “nossa, que saco!”, mas como não tinha uma justificativa concreta para dispensar o trabalho, aos poucos fui aceitando o fato de que teria que fazer a minha parte, até um momento em que comecei a me sentir o próprio exemplo de cidadã (hahaha!).
As eleições foram se aproximando e, enquanto isso, eu me preparava para exercer o papel de secretária da minha seção. Segui as instruções recomendadas e fiz um treinamento no aplicativo dos mesários, que ensinou, entre outras posturas, o que fazer ao chegar, documentos a preencher, fiscalizações necessárias durante a votação e mais – e tudo com um quiz ao final para testar os conhecimentos!
Enfim, 2 de outubro. Chegou o fatídico dia. Acordei cedo e tinha que estar lá por volta das 7h da manhã para deixar tudo preparado para o início das votações às 8h. A minha função era a de secretária, que costuma organizar a fila e quem pode ou não entrar na sala, mas ainda tinham mais duas mesárias e a presidente da seção.
Foi legal porque, logo de cara, nós quatro quebramos o gelo e ajudamos umas às outras, inclusive porque teríamos horário de almoço e, eventualmente, eu teria que sair da minha posição e fazer a função da presidente, por exemplo. Ligamos a urna, registramos a nossa presença, imprimimos a zerésima, colamos os fios da urna com fita crepe no chão… E estávamos prontas para começar um longo período de cerca de 10h de trabalho.
O sinal foi dado e 8h já tinha fila na porta. Um volume de pessoas que nunca tinha visto nas outras eleições! A primeira hora foi bastante movimentada e, perto do almoço, entre 11h e 14h da tarde, tinha muuuita gente também! Vários eleitores ficaram de cara fechada e reclamaram, inclusive para mim, que estava na porta acompanhando tudo. Eu não podia fazer nada – e, como já sabemos, isso aconteceu no país todo. Depois das 15h, tudo ficou bem tranquilo e conseguimos respirar um pouco. Ufa!
Durante o dia, presenciei acontecimentos um tanto curiosos, preocupantes e que até me fizeram rir – pra não chorar. Como quando explicava que, se a biometria da pessoa fosse reconhecida (havia uma tentativa obrigatória de quatro vezes), ela não precisaria assinar o caderno. Do contrário, se a digital não pegasse, aí, sim, era necessário a assinatura no papel. Isso foi motivo de desconfiança para muitas pessoas que infelizmente ainda acreditam haver alguma fraude no processo eleitoral.
Uma mulher, inclusive, voltou exigindo assinar o caderno, mesmo depois de explicarmos que não era necessário. Ela desafiou a competência das mesárias e atrapalhou a fila, que estava enorme, como se, sem isso, seu voto não fosse computado. No final, imprimimos várias vias do documento que sai da urna mostrando os resultados de cada candidato – e, sim, com certeza absoluta o voto dela estava lá.
Outros momentos ~interessantes~ foram quando eu tentava organizar a fila por ordem de preferência, levando em consideração pessoas acima de 60 anos, pessoas com deficiência, gestantes ou com criança de colo. E as reações eram divergentes. Teve quem questionasse minha atitude; teve quem, apesar de ser um direito, recusasse passar na frente, dizendo que era saudável e não precisava disso; e teve quem, quando por um tempo ficamos sem alguém controlando a fila, aparecesse na porta falando (de forma nada agradável, aliás) que queria reivindicar seus direitos.
Não dava para agradar todo mundo, e parecia que poucos entendiam que nosso trabalho era voluntário e que não estávamos exatamente animadas e felizes em estar ali. Por outro lado, não tenho como negar que por ali passaram pessoas muito gentis, simpáticas e bem-humoradas. Vi uma menina de 16 anos animada e ansiosa em votar pela primeira vez, gente que tinha estudado naquela escola há muitos anos e, ao passar pelos corredores, relembrava memórias nostálgicas e as compartilhava comigo… Eu mesma encontrei um antigo professor da época de Ensino Médio que me deu aula em Bauru e mora no mesmo bairro que eu em São Paulo – qual a chance, gente?!
Também presenciei choques de realidade quando as pessoas esqueciam os números dos candidatos durante a votação na urna. Pensava: “Como você não se preparou para isso? Cadê a colinha?”, mas não podia falar nada. Quando um homem reclamou por não conseguir votar em um deputado do Rio Grande do Sul, quando reclamaram que a urna não “estava funcionando”, só que, na verdade, a pessoa tinha esquecido de apertar a tecla “confirma” – e, depois, querem falar de fraude nas urnas… Não há fraude. A urna é inspecionada durante o dia todo, os fiscais vêm conferir o trabalho dos mesários e, ao final, o resultado é impresso direto das urnas.
Foi uma experiência cheia de sentimentos confusos. Embora fosse um trabalho sério, as meninas que estavam comigo deixaram tudo mais legal e descontraído, e foi interessante ver de perto as conversas e atitudes de pessoas tão diferentes entre si. Ao mesmo tempo em que, confesso, ficamos muito cansadas e chegou uma hora em que estávamos contando os minutos para sair dali. Agora, que venha o segundo turno – e mais histórias para contar!