A Justiça de Santa Catarina condenou a repórter Shirlei Alves, do Intercept Brasil, a um ano de prisão em regime aberto e R$ 400 mil em indenizações ao juiz e promotores do caso por utilizar o termo “estupro culposo” em reportagens publicadas sobre o caso Mariana Ferrer.
Na decisão, a juíza Andrea Cristina Rodrigues Studer, da 5ª Vara Criminal da Comarca de Florianópolis, disse que a jornalista cometeu um crime de difamação contra funcionário público.
A gente refresca a sua memória: lembra que, em novembro de 2020, o Intercept publicou trechos inéditos das alegações finais do caso de Mariana Ferrer?
A matéria denunciava, com trechos em vídeo da audiência, a intimidação do empresário André de Camargo Aranha, acusado de estuprá-la, e de seu advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho. Juiz do caso, Rudson Marcos, se omitiu diante da postura inadequada da defesa do acusado.
Em um dos vídeos da reportagem, Mari chega a implorar pela ajuda do juiz. “Excelentíssimo, eu estou implorando por respeito, nem os acusados, nem os assassinos são tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus, gente. O que é isso?”, diz. Enquanto Marcos pediu apenas a Gastão que mantivesse o “bom nível”.
Na época, Aranha foi considerado inocente apesar das constatações de Ferrer de que ela tinha sido drogada e abusada sexualmente. Ferrer tinha 23 anos quando foi estuprada em uma festa em 2018.
O promotor do caso julgou que não teria como saber se a jovem estava ou não em condições de consentir a relação sexual, ao passo que Mari Ferrer recebeu tratamento como se estivesse ocupando o banco dos réus. Na ocasião, o Intercept Brasil usou o termo ‘estupro culposo’ para se referir à condenação, mesmo que o termo não tenha sido utilizado no processo.
Para a juíza que proferiu a condenação, o termo trouxe consequências “nefastas” ao alcançarem o público brasileiro. “A liberdade de expressão, como uma pré-condição para o exercício dos demais direitos e liberdades, detém uma configuração de destaque e preferência no Estado democrático brasileiro”, escreveu a magistrada, segundo o jornal Folha de S. Paulo.
A jornalista Schirlei Alves disse, ao Intercept Brasil, que desde que publicou a reportagem em 2020, foi muito perseguida, principalmente nas redes sociais:
“Meu único desejo era expor a verdade e foi isso que fiz. Apesar do enorme custo pessoal e profissional, eu faria isso de novo hoje. Agora, espero que o sofrimento de Mari Ferrer e o meu possa levar a mudanças para que mais mulheres não tenham que passar por aquilo a que fomos submetidas. Nós merecemos o melhor”, disse a jornalista.
Lei Mariana Ferrer
Após a repercussão do caso, em 2021, foi sancionada a Lei Mariana Ferrer, contra a humilhação de vítimas de violência sexual em audiências. Nós, da CAPRICHO, noticiamos todo o caso. Você pode ler mais a respeito aqui.
O projeto de Lei Mariana Ferrer foi apresentado pela deputada federal Soraya Santos, do PL, um dia após a publicação da reportagem do Intercept, em 4 de novembro de 2020.